Sociedade representou o Brasil em série de reuniões que propuseram e organizaram iniciativas para a região
Na última semana, a Universidade de Miami, nos Estados Unidos, foi palco de uma série de reuniões que prometem mudar o rumo da matemática no continente. O Instituto de Ciências Matemáticas das Américas (IMSA) convidou lideranças de diversas instituições da área com o intuito de estreitar relações e formalizar a criação de um grupo colaborativo para organizar iniciativas entre os países. A Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) esteve representada pelo Presidente Paolo Piccione e pela Vice Jaqueline Mesquita.
A importância do Brasil no grupo é marcante, já que a SBM é parte integrante da delegação responsável pela criação da organização na área. Em Miami, também compareceram lideranças de instituições de referência de Estados Unidos, México, Colômbia, Venezuela, Equador, Paraguai, Chile e Argentina.
O intuito do encontro foi impulsionar a aliança entre países da América Latina, do Norte e do Caribe de maneira a reforçar iniciativas fundamentais, como pesquisas científicas de ponta, eventos de difusão, oferecimento de prêmios para matemáticos de destaque e colaborações internacionais para fazer do grupo uma referência mundial na área.
Oportunidade ímpar
Diretor-Executivo do IMSA, Ludmil Katzarkov enxerga o potencial e a elevada qualidade de formação dos profissionais de matemática da América Latina e declara o maior intuito da instituição a curto e médio prazo. “Uma das nossas prioridades é abrir portas para criarmos um grupo de pesquisa de ponta e reunir os melhores matemáticos de toda a América Latina envolvidos nesse projeto global. Ficamos muito impressionados com a qualidade acadêmica dos alunos. Temos uma forte crença de que todo o investimento na jovem geração de matemáticos latino-americanos terá o retorno que esperamos”, vislumbra.
O Instituto estadunidense também foi representado durante a semana pelo Executivo Sênior de Divulgação Global, Ernesto Lupercio, pela Executiva Sênior de Divulgação Global, Gabriela Olmedo, pela Executiva Sênior de Divulgação, Mina Teicher, pelo Executivo Associado de Divulgação Global, Bernardo Uribe, pelo Presidente do Comitê Consultivo Científico, Phillip Griffiths, e pelo Diretor Fundador, Robert Cantrell.
Jaqueline Mesquita reforça que o estabelecimento de um grupo de Sociedades da América Latina e Caribe tem por objetivo aumentar a participação de pesquisadores da área em instituições de referência como o IMSA. “Queremos conseguir, por meio da rede de colaboração dessas Sociedades, fomentar as ações de maneira a trazer latino-americanos para o IMSA. A ideia é que o IMSA se torne uma porta de entrada para colaborações entre os latinos e com outros pesquisadores dos EUA e Canadá”, completa.
Na série de reuniões em Miami, instituições de referência em matemática de nações vizinhas do Brasil aprovaram a iniciativa, especialmente por agregar elementos em comum com outras comunidades. Diego Recalde, Vice-Presidente da Sociedade Equatoriana de Matemática, crê que a interação com países de maior desenvolvimento pode ajudar os jovens alunos de seu país.
“O mais importante é conhecer pessoas de outras áreas de Matemática de outras nações, já que, por exemplo, no Equador, as pesquisas e estudos não são difundidos. A oportunidade de conhecer outros matemáticos de áreas distintas e saber o que fazem impacta principalmente aos estudantes jovens que querem estudar nessas áreas. É importante para eles terem alguém para se inspirar na hora de fazer um mestrado, um doutorado”, opina Recalde.
Presidente da Sociedade Matemática Chilena, Mario Ponce corrobora o ponto de vista. “Estou contente em ver que esse encontro é importante também para os próximos passos da nova geração. Fazemos parte de Sociedades Matemáticas engajadas e integradas à cultura latino-americana que participam desses encontros fundamentais para as crianças, aos mais jovens alunos. Precisamos estar sempre conectados a essa rede de colaboração mundial de maneira que a matemática possa contribuir e ter o impacto ideal na sociedade”, declara.
A forte crise econômica de vários países na América Latina faz com que o encontro em Miami tenha uma conotação ainda mais primordial para o desenvolvimento da área de matemática na região. É o que afirma Wilfredo Urbina, representante da Associação Venezuelana de Matemática. “A Venezuela é um caso extremo. Faltam recursos e investimento para nós. Infelizmente, é uma constatação que, sem financiamento, fica difícil implementar qualquer iniciativa. Por isso, este evento foi muito produtivo para comparar e entender um pouco a situação de cada Sociedade e compartilhar problemas em comum”, analisa o pesquisador.
Diretora de Publicações da União Argentina de Matemática, Victoria Paternostro avalia que a colaboração entre os países do continente, com dificuldades em comum, beneficiará o desenvolvimento intelectual dos profissionais acadêmicos da área.
“A principal dificuldade que enfrentamos hoje, infelizmente, é econômica e, ao mesmo tempo, política. Liderar projetos de matemática com uma moeda fraca economicamente como a da Argentina é muito complicado. Por isso, o intercâmbio ajuda demais a fortalecer os laços para a atuação das Sociedades, tanto individualmente quanto em conjunto. Nós temos intercâmbios muito fortes da Argentina com distintos países, temos matemáticos muito conceituados e este grupo vai fortalecer ainda mais a relação com profissionais de todos os lugares das Américas”, confia.
No Paraguai, o estudo específico em áreas de Matemática é relativamente novo. Christian Schaerer, Presidente da Sociedade por lá, destaca também que a troca de conhecimento com profissionais de outras nações em Miami vai ajudar a difundir uma mentalidade mais rica, além de fortalecer o grupo no continente.
“O networking internacional, para mim, é o ponto fundamental pelo qual estamos aqui neste evento. Nós, paraguaios, necessitamos de ajuda internacional para que essa sementinha, plantada lá atrás e que estamos cultivando, possa gerar frutos. A interação entre toda a América é uma necessidade imediata e vejo este intercâmbio como algo muito positivo. Sonho que tal mentalidade possa ser aprofundada em temas muito ricos como investigação de tecnologia de ponta, em todas as linhas da matemática: a Aplicada, a Espacial e a Aeroespacial, Inteligência Artificial. Neste momento, as fronteiras estão se rompendo”, crê Schaerer.
Presidente da Sociedade de Matemática da Colômbia, Alf Onshuus admite que não sabia o que esperar do evento em Miami, especialmente por seu país guardar uma particularidade dentre todos da América Latina. “É muito importante fazer parte de algo grandioso. Particularmente, na Colômbia, há uma dificuldade de integração local, porque, de um lado, temos Brasil, Uruguai e Argentina, que têm colaboração há anos. Por outro, temos México, Estados Unidos e, em certos casos, países da América Central. E a Colômbia sempre ficou muito isolada. Porque estamos no centro de tudo. A não ser que você tenha uma ideia pan-americana, geralmente você é excluído. Por isso, o foco deste evento é muito importante. Ter em mãos experiências de pesquisas de ponta na área de Matemática dos EUA é algo excepcional”, explica.
Intercâmbio de ideias
Gabriela Araújo, Presidente da Sociedade Mexicana de Matemática, indica que muitos estrangeiros acabam rumando para a América do Norte em busca de uma melhor formação na área. Por isso, a troca de conhecimento de referências dos países latino-americanos ajuda a engrandecer ainda mais o evento sediado na Universidade de Miami.
“Recebemos muitos estudantes colombianos, como no Instituto em que trabalho no México. Temos estudantes de mestrado colombianos, assim como brasileiros que fazem intercâmbio. Se desenvolvermos mais esta aproximação entre as Sociedades, podemos incrementar ainda mais processos de intercâmbio, promover cursos e focar em certos temas. Essa aproximação é benéfica e vai reforçar muitos vínculos de entrada para o IMSA”, acredita a pesquisadora.
Liliana Forzani, Presidente da União Matemática da América Latina e Caribe (UMALCA), destaca que a iniciativa ao longo da semana mostra frutos positivos para todas as nações participantes e pode impactar em novo rumo da matemática, incluindo no fortalecimento das mulheres da área.
“Uma coisa importante dessa reunião, em particular para a UMALCA, é notar que temos programas exitosos e que funcionam bem, mesmo em países com problemas econômicos. Estamos aproveitando essa semana para conhecer pessoas presencialmente e aumentar a possibilidade de conseguir fundos para programas muito importantes em países pequenos. Além disso, é importante fortalecer a relação entre as mulheres latino-americanas que têm perspectiva de gênero, pois ficamos mais próximas em chegar a objetivos de igualdade”, opina.
Próximos passos
Paolo Piccione é proativo em indicar as próximas iniciativas do IMSA discutidas no encontro com os companheiros latino-americanos. “Estão sendo planejadas atividades de extensão e divulgação para a comunidade. E uma das iniciativas concretas é a criação de três prêmios anuais para matemáticos, dois deles direcionados para jovens e um para matemáticos de boa qualidade. Estamos já planejando isso para 2024”, cita.
A ideia, complementa Jaqueline Mesquita, é que as honrarias sejam anuais e aconteçam no mês de janeiro. Outro objetivo é realizar em parceria com o México um congresso em 2025 e o evento em Miami serviu para debater detalhes sobre a organização de tais eventos.
“Nesses dias mais intensos, foi muito bom para estreitarmos as relações com essas Sociedades da América Latina. E uma das coisas que temos pensado em fazer com o México é um evento em 2025. Um evento organizado pelas Sociedades Brasileira e Mexicana de Matemática é uma de nossas perspectivas. Também, como vai ter aqui em 2025 o Congresso da Américas, a SBM pensa em propor uma sessão especial voltada para as mulheres da área de matemática. Não podíamos deixar de trazer essa discussão tão importante em um evento tão grandioso”, conclui a Vice-Presidente da SBM.