Baiano de 44 anos é docente nas redes estadual e privada da Bahia e já teve uma preparação antecipada para a viagem a Xangai, no fim de semana, quando conhecerá a estrutura chinesa, referência mundial no ensino de Matemática
Na próxima sexta-feira (13), os dez medalhistas de ouro da 1ª Olimpíada Brasileira de Professores de Matemática do Ensino Médio (OPMbr) embarcam para a China, onde terão o privilégio de conhecer o método de ensino do Centro de Educação para Professores da Unesco (TEC Unesco), em Xangai. O país asiático lidera o ranking do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), principal avaliação da Educação Básica no mundo, em Matemática.
Um dos docentes brasileiros de Matemática confirmados no voo ao Oriente é o baiano José Fábio de Araújo Lima, de 44 anos. O professor do colégio Centro Integrado de Educação Assis Chateaubriand, em Feira Santana, é um dos cinco vencedores que são egressos do Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (PROFMAT), coordenado pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), e está ansioso pela experiência em território chinês.
“As expectativas são as melhores possíveis. Já estamos passando por um processo de preparação há algum tempo para a viagem. Esse processo foi ter aulas on-line sobre o sistema educacional de Xangai, tudo que diz respeito à educação deles, afinal porque eles são os melhores do ranking Pisa. E aqui, no Brasil, como há uma discrepância de pesquisa e ensino, queremos aprender com eles e tentar trazer aquilo que for possível para adaptar e colocar em prática. Certamente, o aprendizado e a experiência serão extraordinários”, declara.
Mas muito antes de assegurar sua viagem à China, a trajetória do professor baiano começou em um lugar bem simples e longe dos holofotes.
Infância
Fábio Lima, como gosta de ser chamado, nasceu na pacata Tanquinho, de apenas 7.000 habitantes. Como todo morador da zona rural, ele se acostumou a ajudar a família trabalhando na roça. Naquela época, os braços eram usados na enxada em vez de empunhar o lápis.
Só que, esperto desde pequeno, Fábio sabia que o estudo, além de guiá-lo para um futuro melhor no quesito socioeconômico, também era uma forma de tirá-lo do sol escaldante do sertão baiano.
“Eu sempre gostei de estudar. Morávamos em um pequeno sítio que só foi ter energia elétrica quando eu estava próximo da maioridade. Nunca gostei de trabalhar na zona rural, por isso eu sabia que a única chance de fazer algo diferente dos meus colegas era estudando. Então, sempre estudei com o objetivo de entrar numa universidade, ter uma condição melhor que as pessoas da minha família”, conta.
Do 1º ao 5º anos do Ensino Fundamental, José Fábio estudou em uma escola rural, na qual não havia divisão por séries. A mesma professora ensinava todos os alunos no mesmo período. A situação mudou quando a prefeitura de Tanquinho disponibilizou um caminhão para transportar os estudantes para um colégio na zona urbana.
“A prefeitura trouxe um pau de arara e ficávamos na carroceria do caminhão, que nos levava para a cidade, onde tinha um colégio a partir do 6º ano até o fim do Ensino Fundamental. Depois, a prefeitura melhorou um pouco e nos disponibilizou um ônibus, mas era assim a minha vida”, reforça o baiano.
Despertar matemático pelo ensino
Primeiramente o apego pela Matemática veio em casa. “Meu pai sempre me ajudava nas quatro operações básicas. Aprendi tudo isso com ele”, complementa José Fábio, que faz questão de enfatizar que os professores da disciplina durante sua grade escolar eram muito competentes. Mas você acredita que o baiano gostou mesmo da arte de ensinar a área mais tradicional das Ciências Exatas graças a um professor de…Biologia?
“Nós tínhamos um professor espetacular de Biologia e ele fez um seminário sobre genética. Meu grupo ficou responsável pelas probabilidades que existem em genética e daí apresentei para minha turma inteira. Foi uma boa apresentação e acho que, naquela aula, eu me encontrei como profissão. Foi aquela experiência que foi decisiva para que minhas escolhas fossem ensinar e, acima de tudo, ensinar Matemática”, confirma.
Após o Ensino Médio, o baiano não conseguiu passar no vestibular ‘de primeira’ por causa da redação. A lição foi aprendida rapidamente e, seis meses depois, lá estava Fábio aprovado no curso de Licenciatura em Matemática pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).
Apesar da proximidade de Tanquinho à Feira de Santana, José Fábio se mudou para a cidade feirense, a 110km de Salvador, onde morou primeiramente com a tia e a avó. Após completar a graduação em 2006, ele ‘juntou suas coisas’ para viver a solo. Em 2007, foi convocado para dar aula como professor efetivo na rede estadual, onde ensina centenas de alunos até hoje.
De 2007 a 2009, ele se qualificou ainda mais para suas aulas ao fazer uma Especialização em Metodologia do Ensino da Matemática no Instituto Brasileiro de Pós-Graduação e Extensão (IBPEX). Mas o desejo de se capacitar ainda mais tirava o sono de José Fábio. O problema é que Feira de Santana ainda não encampava nenhum curso de Mestrado em Matemática.
PROFMAT como divisor de águas
O PROFMAT, do qual havia ficado sabendo pelo Programa de Aperfeiçoamento de Professores de Matemática do Ensino Médio (PAPMEM), do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), virou uma possibilidade. “Mas o mais próximo era na Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador”, lembra Fábio, que já havia constituído família em Feira de Santana.
Ainda assim, ele tentou a prova de admissão para o PROFMAT na UFBA em 2010, mas não conseguiu ser aprovado. A experiência só motivou José Fábio a dar a volta por cima.
“Peguei todas as provas da 1ª fase da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) quanto da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) e passei um ano inteiro me preparando. Porque a gente sabia que a UEFS estava em processo de credenciamento ao PROFMAT”, revela.
A tática deu certo: José Fábio passou em 1⁰ lugar da primeira turma do PROFMAT pela UEFS. O professor reconhece que o programa de Mestrado da SBM foi instrumento fundamental de aprendizado e conhecimento na sua carreira.
“O PROFMAT foi um importante divisor de águas. Eu sempre gostei de trabalhar em Olimpíadas de Matemáticas, inclusive participo ativamente da OBMEP desde 2005. Mas ainda assim achava que faltava alguma coisa para melhorar a minha capacitação como professor. A OBMEP me deu essa base, mas foi o PROFMAT que me deu aquele salto de qualidade, já que conseguimos aprimorar muito do que aprendemos no Ensino Básico. A partir do PROFMAT, surgiram ideias que implementamos na escola e fora dela”, relata José Fábio.
Hoje, Fábio Lima tem um canal no YouTube para treinamento sobre Olimpíadas de Matemática criado a partir da aula de Software Geométrico no PROFMAT. Com mais de 7.000 inscritos, a plataforma é uma contribuição do programa da SBM na vida do baiano, que está prestes a embarcar na maior experiência internacional de sua vida. Nada mal para o cidadão de Tanquinho!