Professora da Unicamp é referência em Estatística no Brasil e foi uma das várias mulheres que adentraram no rol da entidade. Nancy foi Vice-Presidente da SBM de 2017 a 2021
Em dezembro, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) anunciou seus novos membros titulares, correspondentes e afiliados. A cerimônia de posse dos novos eleitos ocorrerá em 2024. As mulheres são maioria – 60% – entre os novos integrantes da entidade, refletindo uma tendência de igualdade de gênero no topo da carreira científica.
A paulistana Nancy Lopes Garcia foi a única especialista da área de Ciências Matemáticas a entrar para o rol de membros titulares da ABC. A docente da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) receberá seu diploma em maio do ano que vem, durante a Reunião Magna da Academia, no Rio de Janeiro.
Aos 59 anos, Nancy é uma das profissionais mais reconhecidas dentro da Unicamp, sendo referência no Departamento de Estatística, onde é professora titular desde 2002. Sua especialização na área – ainda com o mestrado no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), no Rio de Janeiro – lhe rendeu uma experiência de doutorado fora do Brasil, mais precisamente na Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, em 1993.
“É uma grande conquista. É como meu orientador de doutorado disse: ‘O objetivo é fazer coisas boas, mas é sempre bom quando alguém percebe’. É um reconhecimento de todo meu trabalho ao longo de todos os anos, tanto na minha produção científica, da minha atuação como formadora de recursos humanos com minhas orientações em todos os níveis (iniciação científica, mestrado e doutorado), bem como nas supervisões de Pós-Doutorado e nas contribuições para a comunidade matemática. Tenho muito orgulho da minha trajetória, mas mais ainda dos meus alunos que hoje estão em diversas partes do mundo como professores ou como profissionais bem-sucedidos”, declara Nancy, que foi Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) de 2017 a 2021 durante os mandatos de Paolo Piccione.
PAIXÃO PELA MATEMÁTICA
Natural do tradicional bairro da Mooca, na zona leste de São Paulo, Nancy aprendeu desde a infância a se acostumar com a mudança. Com cinco anos, saiu da capital para residir em um sítio em Atibaia, onde viveu até os 12. O período escolar continuou em Itatiba até passar no vestibular em Estatística pela Unicamp.
Campinas passou a ser sua nova casa frente aos desafios de sua trajetória acadêmica. Mas você ficaria surpreso se soubesse que o preconceito tirou Nancy de sua primeira opção? “Sempre gostei muito de Matemática, sempre fui bem e essa era a matéria em que me saí melhor durante todo o Ensino Fundamental. No Ensino Médio, fiz colégio técnico em Edificações e queria ser Engenheira Civil. Porém, na época, se dizia que Engenharia Civil não era carreira para mulher e eu resolvi fazer Computação que era a grande moda na época. Não passei no vestibular, passei para Estatística e resolvi seguir essa carreira”, conta.
MULHERES NO TOPO
Após completar sua especialização no exterior, Nancy retornou ao Brasil em 1993 para atuar de forma efetiva na Unicamp. Através do conhecimento no doutorado, a professora trabalha com Probabilidade, e também na área de inferência para Processos Estocásticos e Análise de Dados Funcionais. Olhando para trás, ela admite que a maioria de suas inspirações em todos os processos educacionais foram homens, por isso a nova realidade da ABC é importantíssima para as meninas que sonham com a carreira na Matemática.
“Minhas referências quase todas eram masculinas desde a graduação, então acho muito importante que existam mulheres ativas que possam servir de exemplo de que ‘lugar de mulher é onde ela quiser’. É possível galgar todos os passos na carreira, no meu caso, na academia. Tivemos muitas conquistas nos últimos anos em termos de equidade de gênero, entretanto, ainda temos muito para alcançar, por exemplo, dentre os alunos de pós-graduação em Matemática/Probabilidade e Estatística, as mulheres são apenas 25%. Porém esta proporção diminui conforme se galgam os cargos mais altos da carreira. Esta conquista como membro da ABC é um mais passo nessa direção”, opina a pró-reitora de Pós-Graduação da Unicamp do período de 2018-2021 e coordenadora da área na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
LEGADO
Até hoje, Nancy publicou mais de 60 artigos científicos, alguns com elevada repercussão na comunidade internacional. Além disso, sua contribuição para os estudantes a fazer orientar mais de 35 trabalhos de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado. E para as novas gerações de matemáticos: qual o conselho da paulistana, que, agora como integrante permanente da ABC, ultrapassa mais uma barreira de respeito dentro da área?
“A Matemática é a linguagem do mundo. A área de Matemática é ampla, vai desde subáreas muito teóricas como Álgebra até subáreas muito aplicadas como Estatística e a tão badalada Ciência de Dados. Há campo de trabalho que vai desde universidades e núcleos de pesquisa, até indústria, mercado financeiro e análises forenses. Estudar Matemática amplia o horizonte, os matemáticos conseguem pensar de modo abstrato e ver conexões que outros não conseguem enxergar”, indica Nancy.