Evento aproximou matemáticos de todos os níveis e regiões do Brasil
Terminou, na última sexta-feira (24), a décima edição da Bienal da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), maior evento da área no Brasil. A Universidade Federal do Pará (UFPA) em Belém foi o palco do encontro, que reuniu, durante toda a semana, pesquisadores, professores e alunos de todos os níveis de ensino e demais interessados na área para dezenas de atividades.
A Bienal foi marcada por exposições matemáticas de fato, com pesquisas importantes e avanços de destaque na área, mas também concentrou discussões a respeito do papel social da Matemática. Com as atividades transmitidas ao vivo no canal da SBM no YouTube, essa foi a primeira edição do maior evento de Matemática no Brasil a ser realizada na região norte do país, o que provocou debates a respeito de inclusão em diversos âmbitos.
“É muito importante receber um evento dessa magnitude aqui na UFPA. A região da Amazônia tem uma logística bem única, de difícil acesso, e isso mostra que a SBM está olhando para outros lugares do Brasil e dando a oportunidade para que estudantes aqui da Amazônia, do norte do Brasil, possam sonhar um pouco mais, conhecer várias pessoas, adquirir novos conhecimentos, se inspirar e expandir seus horizontes”, comemorou Jonata Neves, aluno de graduação em Matemática e Presidente do Centro Acadêmico de Matemática (CAMAT) da UFPA.
Ao todo, foram mais de 1200 inscritos na X Bienal de Matemática – muitos deles alunos de cidades espalhadas pelo Pará. “Eu poderia dizer que 95% desses alunos nunca participaram de uma Bienal de Matemática. A gente sabia que, para muitos deles, essa seria a única oportunidade de participarem desse evento, devido às condições financeiras e até mesmo geográficas aqui do nosso estado. Então, nós ficamos muito felizes quando a Bienal veio para cá pela primeira vez”, comentou o professor João Rodrigues dos Santos Junior, da UFPA, Coordenador do Comitê Organizador da Bienal.
“O que a gente mais quer é que esses eventos da Sociedade Brasileira de Matemática, como a Bienal, sejam itinerantes e que passem pelas diferentes regiões, pelas diferentes cidades, justamente para podermos amplificar esse público”, ressaltou Jaqueline Mesquita, Vice-Presidente da SBM.
“A Bienal de Matemática é um evento diferente. Um evento voltado para comunidade mesmo, mais ampla do que a comunidade acadêmica. Nós temos uma obrigação, realmente, de planejar atividades que tenham como objetivo e como público-alvo, essas pessoas, professores de ensino médio, professores de ensino básico, alunos de ensino médio também, isso é muito importante. Um dos nossos objetivos também é atrair jovens para nossa disciplina. A matemática é, entre as ciências, uma das mais criativas. E, se tem uma coisa que não falta no Brasil, entre os jovens, é talento e criatividade. Então o Brasil tem tudo para ser um país de grandes matemáticos”, vislumbrou Paolo Piccione, Presidente da SBM.
Além da inclusão da região norte no circuito dos eventos de Matemática no Brasil, a Bienal também levantou questões relacionadas à inclusão de gênero e raça na área ao focar na diversidade dos plenaristas e nos temas das palestras e mesas redondas. O professor Agnaldo Esquincalha, da UFRJ, apresentou a palestra “Diferença, Inclusão e Educação Matemática” e comentou sobre as dificuldades de desconstruir a ideia de que a Matemática não deve se envolver com questões sociais. “Entendemos a Matemática como uma ferramenta de leitura e de escrita do mundo. Então, por meio da Matemática, podemos mudar realidades, ‘empoderar’ matematicamente essas minorias. Então é importante que as pessoas saibam Matemática. Quando todo mundo souber matemática, ela vai perder esse status de poder, mas isso é bom, porque todo mundo vai estar no mesmo nível para poder fazer suas construções e as suas modificações na vida por meio da matemática. Isso é fundamental”, analisou.
Mulher, preta e moradora de uma comunidade no Rio de Janeiro, Vanessa Miguel, a “Boamática” – alcunha que recebeu por seu trabalho nas redes sociais -, representa diversas minorias em um mundo majoritariamente branco e masculino. Atualmente, é estudante de pós-graduação na UERJ e professora da educação básica, e, por tudo isso, comemorou a oportunidade de participar de um evento que foca em promover a diversidade. “A inclusão precisa ser feita. A Matemática segrega muito. É importante esse movimento de resgate, trabalhar essa parte de descolonização, de decolonialidade, e com o que eu estudo, que é a Boamática, trabalhar com as crianças e levar para elas essa Matemática que está lá no topo, a que só os favorecidos têm acesso, porque preto faz ciência também. Então a gente precisa estar sempre nesses eventos”, resumiu.
Atividades variadas
A programação da Bienal foi recheada de atividades que contemplaram desde as áreas mais triviais às mais avançadas de Matemática, indo de estratégias de ensino na educação básica até pesquisas acadêmicas na fronteira do conhecimento.
Os cinco dias de evento trouxeram palestras plenárias, mesas redondas, minicursos, oficinas, seções de comunicação oral, exibições de pôsteres, exposições da iniciativa Matemática, Tecnologia e Arte em Territórios Múltiplos (MaTeAr) e apresentações culturais, além de espaços para a divulgação de outros projetos e do trabalho de sociedades parceiras.
O Presidente da Sociedade Brasileira de Matemática Aplicada e Computacional (SBMAC), Pablo Martin Rodriguez, participou da mesa redonda “Custos e benefícios da formação de um pesquisador em matemática” e salientou a importância do trabalho conjunto entre as Sociedades. “Foi muito bom o espaço cedido pela SBM para que a SBMAC mostre o que está fazendo, as atividades recentes, e essa é uma parceria que continua com os anos. Temos muitas interações em conjunto, muita cooperação, e para nós é bom porque a SBM é uma sociedade bem estabelecida, de importância no nível nacional e internacional, e é bom para reforçar as parcerias das nossas Sociedades”, celebrou.
Expectativas alcançadas
Os esforços conjuntos entre SBM e UFPA transformaram a X Bienal de Matemática em um sucesso absoluto. Da importância da primeira realização do evento na região norte à execução da logística e do planejamento previstos, os participantes e os organizadores do encontro se mostraram plenamente satisfeitos com a Bienal. Confira alguns relatos:
“Foi um evento supercomplicado de se organizar. A UFPA é impressionante e possui um corpo docente extremamente ativo. Colocaram entusiasmo, o próprio Reitor veio participar. É o primeiro evento que eu vejo com uma quantidade tão grande de participantes e nós estávamos preocupados com o sucesso. Essa preocupação era totalmente infundada. Estão de parabéns todos os organizadores e todos os participantes também, que decidiram participar apesar das dificuldades. É um sucesso espetacular e eu fico muito satisfeito”, festejou Paolo.
“Eu acho que fomos muito felizes nas escolhas que fizemos, porque os feedbacks que tive foram muito bons. As pessoas vêm me agradecer, de uma forma muito sincera, a oportunidade de estar podendo encontrar pesquisadores com tanta qualidade, temas tão importantes sendo discutidos, minicursos tão interessantes acontecendo, oficinas e palestras. Isso para mim é o melhor de tudo. Foi um evento de sucesso e diria que valeu muito, muito a pena todo o esforço que a gente fez”, relatou Walcy Santos, Diretora da SBM.
“O evento é surpreendente, um nível muito bem organizado, participação bem grande de todos os níveis da comunidade acadêmica, alunos, professores, os técnicos, e também bastante diversidade aqui, sendo marcante a volta dos eventos presenciais”, resumiu Daniel Gonçalves, também membro da Diretoria da SBM.
“Eu amei. Foi muito importante esse evento, que teve esse olhar para educação básica junto com a Matemática. Na verdade, é a ciência, mas é uma integrada na outra, então foi muito produtivo. Eu gostei muito, muito mesmo”, disse Vanessa.
“Acredito que o nosso maior foco são pessoas como nós, que entraram na universidade por meio de cotas, por meio da questão social, e que não têm um acesso muito grande através da questão financeira, através da internet, não têm uma estrutura, e a gente pode pegar isso que está acontecendo no evento e fazer uma espécie de transposição para que essas pessoas, que têm menor poder aquisitivo, menor conhecimento social, possam também estar alcançando um conhecimento tão rico e tão exclusivo como esse que está sendo ministrado aqui na Bienal”, elogiou Jonata.
“A Universidade como um todo nos apoiou, desde a administração superior até o Instituto que é a unidade onde está hospedada a Faculdade de Matemática. Acredito que a quantidade de pessoas que nós esperávamos aqui veio. Eu avalio positivamente a participação e a realização da Bienal aqui”, finalizou João.